abril 11, 2007

Fim do expediente

Eram vinte e dois degraus. Impressionante como tentamos encontrar artifícios para tornar aquele caminho tão rotineiro diferente. Seis andares, separados por escadarias de vinte e dois degraus até encontrarmos portas de vidro representando liberdade. E foram justamente essas que me fizeram parar, na saída do prédio onde trabalho. O que eu vi ali mudou minhas percepções... Para pior.

Ao lado de fora, muitos prédios, vários andares, com janelas e portas de vidro. Dava para se ver tudo, salas de reuniões a recepções. Pessoas trabalhadoras, contando dinheiro, tempo, histórias, lucros, prejuízos. Tudo em movimento. E eu estava ali, a nem cinco minutos atrás, contando os degraus.

Me deu vontade de sentar e ficar observando, ali mesmo, ao lado de fora, o belo reality show da mediocridade. Um sistema pálido, no mínimo uma convenção de arquitetos teria desenhado todas aquelas salas. Aspecto “clean”, luzes econômicas, frieza ao extremo, tudo igual. Tinha até um solitário vaso de planta, só faltou mesmo o beija-flor...

Vinte e três anos vividos em uma cidade planejada, em meio a tantos prédios e eis que me pego naquele momento como um turista. Respirei fundo pela minha predestinação.

Não há o que me prove o contrário, em cada uma daquelas pessoas, uma tristeza, angústia, vontade de mandar o aspecto “clean” e as luzes econômicas pra... E garanto, concordariam comigo os passageiros do ônibus das 18h10. Nada, absolutamente nada, poderia desviá-los do caminho de casa naquela hora.

No ônibus até procurei por coleiras naquelas pessoas ou um chip que as guiassem ao seu líder superior todos os dias. Algo que as submetessem, rotineirasse suas vidas. Alguma explicação para uma inserção tão triste e ao mesmo tempo, tão voluntária.

Definitivamente eu não me encaixo, não passa pela minha garganta. E foi justo nesse momento, em casa, renegando, que o interfone tocou: “Entrega para Srta. Milena, pescoço tamanho 16”. Ficou apertada, dizem que eu me acostumo. E tudo bem que doa, é isso o que todos querem, não é? Ganhei a minha, mais uma na jogada. Agora, de uma vez por todas, chega de contar degraus na escada.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Acho que eu também gosto de contar degraus...

8:17 PM  
Blogger leila figueiredo said...

ola milena, lendo o seu texto lembrei de um trecho de Alice.
"Venha pra cima, querida! Vou olhar pra cima e falar: Quem sou eu então? Primeiro me digam isso, e depois, se eu gostar de ser essa pessoa, vou subir. Se eu não gostar, vou ficar aqui embaixo até ser outra pessoa"

9:29 AM  

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